Proposta cria regime jurídico especial para animais, assegurando a eles o direito de serem representados na Justiça em caso de violações
Aspectos jurídicos do Projeto de Lei 6054/19, conhecido como “PL animal não é coisa”, colocaram em lados opostos, nesta sexta-feira (15), ativistas da causa animal e criadores. Para os ativistas, o texto garante que animais vítimas de maus-tratos tenham, por via judicial, a devida reparação do dano a ele causado. Criadores, adestradores e segmentos do agronegócio acreditam que a proposta abre brechas para demandas judiciais absurdas, tais como questionar a pecuária e o adestramento sob a alegação de proteção animal.
O Projeto de Lei 6054/19 (antigo PL 6799/13) cria um regime jurídico especial para animais não humanos, assegurando a eles, mesmo não tendo personalidade jurídica, o direito de serem representados na Justiça em caso de violações. O texto também veda o tratamento desses animais como coisas, reconhecendo-os como seres sencientes, ou seja, passíveis de sofrimento.
Aprovado pela Câmara dos Deputados em 2017, o projeto foi alterado no Senado em 2019. Os senadores incluíram emenda estabelecendo que a medida não se aplica a animais usados na agropecuária, em pesquisas científicas e em manifestações culturais.
O texto aguarda agora votação na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara, que realizou audiência pública a pedido do autor do projeto, deputado Ricardo Izar (PP-SP).
Rabadan disse ainda que a alteração da natureza jurídica dos animais não humanos pode saturar o judiciário com o que considerou "demandas bizarras". “Seu vizinho, pelo simples fato de não gostar de você, decide representar os interesses do seu cão em juízo, pedindo Habeas Corpus, ação de alimentos e indenização. Motivo: você não deixava o cão entrar em casa”, disse. “Não podemos deixar de alertar para o risco de pedidos matrimoniais e de reconhecimento conjugal interespécies, o que seria uma legalização da zoofilia”, acrescentou.
"Todos os que criam, tratam e cuidam dos seus animais não devem temer se o fazem corretamente. Só devem temer o projeto aqueles que querem manter situações de degradação, abuso, negligência, omissão ou crueldade contra animais”, disse ela.
Autor do projeto, o deputado Ricardo Izar disse que a medida apenas reconhece a senciência dos animais. Ele também entende que a proposta não impede qualquer atividade produtiva ou de adestramento nem o uso de animais em áreas como saúde e segurança. “Isso não vai mudar em nada a relação dos pacientes com os animais. Juridicamente, o projeto não proíbe essa questão”, disse o deputado, referindo-se ao uso de cães no tratamento do autismo.
Diante das divergências, a presidente da comissão, deputada Carla Zambelli (PSL-SP) sugeriu que Izar, por ser o autor, solicitasse o arquivamento do projeto e apresentasse outro apenas proibindo o tratamento de animais como coisas e os reconhecendo como seres capazes de sentir dor, ou seja, com outra abordagem jurídica. Izar, no entanto, defendeu a manutenção do projeto por entender que todas as espécies de animais não humanos merecem respeito. “Não retiro.”
Contrários à aprovação do PL, representantes da Associação Nacional de Defesa dos Agricultores, Pecuaristas e Produtores da Terra; da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação; da Confederação Brasileira de Cinofilia; e do Sindicato Nacional dos Criadores de Animais defenderam o arquivamento do texto.
“Entendemos que animais não têm direitos, pelo simples fato de não poderem ser atribuídas a eles quaisquer obrigações, princípio básico do Direito. O homem é que deve ter a obrigação de cuidar dos animais, que devem sim ter garantias e proteções”, argumentou Guilherme Bunguer, diretor do sindicato.
Por outro lado, a promotora de Justiça do Estado de Minas Gerais Monique Gonçalves e o juiz Federal no Paraná Vicente Ataíde Junior defenderam a tese de que todos os animais sencientes sejam sujeitos de direitos despersonificados, como prevê o projeto.
“O animal deixará de ser o objeto material do crime para ser o sujeito passivo, a vítima. A diferença é que os atos de maus-tratos, do ponto de vista civil, vão resultar em responsabilidade direcionada ao próprio animal, permitindo indenizações para custear o tratamento ou por danos morais”, disse a promotora.
Ataíde Junior sustentou que o projeto vai possibilitar uma nova estrutura de proteção dos animais. Para ele, a proteção pela criminalização dos maus-tratos (Lei Sansão) é insuficiente. “O processo penal não dá recursos para o tratamento médico veterinário nem para a satisfação de outras necessidades do animal”, disse. Ele rebateu a ideia de que o projeto vai criar demandas bizarras afirmando que só poderão ser questionados casos concretos de maus-tratos.
Reportagem – Murilo Souza
Edição – Ana Chalub
Fonte: Agência Câmara de Notícias
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