Quando foi lançada, no final dos anos 50, a
talidomida logo conquistou grávidas no mundo inteiro. Os comprimidos eram
extraordinariamente eficazes contra os enjoos matinais típicos dos primeiros
meses da gestação. Iniciava-se a maior tragédia da história da medicina. Em
vários países, o Brasil incluído, mulheres dariam à luz bebês deformados — com
braços e pernas encurtados ou simplesmente sem braços e pernas. A talidomida
havia sido posta à venda sem que os efeitos sobre o feto fossem conhecidos. O
remédio foi banido das farmácias no início dos anos 60. Já era tarde. Estima-se
em até 15 mil o número de bebês que nasceram com as malformações físicas da
talidomida.
tinha-se a ideia de que a placenta funcionava
como um escudo que protegia o feto das substâncias nocivas ingeridas pela mãe.
O episódio da talidomida serviu para ensinar aos laboratórios farmacêuticos,
aos cientistas e aos médicos que remédios que fazem bem para a mulher podem ser
fatais para o bebê em formação.
Os medicamentos percorrem o mesmo caminho dos
nutrientes para chegar ao sangue do feto. O problema é que, ao contrário da
mãe, o bebê no útero ainda não tem capacidade de metabolizar corretamente as
drogas. A amarga lição deixada pela talidomida vale até hoje, apesar de todos
os avanços da medicina: uma grávida não deve tomar nenhum remédio —
absolutamente nenhum — sem antes consultar o médico responsável pelo pré-natal.
Drogas vetadas
O ibuprofeno, um dos anti-inflamatórios mais
populares do mercado, pode desencadear aborto espontâneo. O captopril, que
controla a hipertensão, pode matar o bebê por falência renal. O antibiótico
tetraciclina pode deformar os ossos do feto e deixar os dentes com manchas
acinzentadas. O lítio, usado no tratamento do transtorno bipolar, pode provocar
defeitos no coração.
Até mesmo a aparentemente inofensiva
aspirina, que é vendida sem receita médica, oferece riscos — pode prolongar a
gravidez e causar hemorragia na mãe e na criança. Como alternativa segura à
aspirina, os médicos receitam o paracetamol e a dipirona.
Outra droga vetada para as grávidas é a
isotretinoína (princípio ativo do Roacutan). Trata-se do mais potente dos
remédios contra a acne. Ao ultrapassar a placenta e chegar ao organismo do
bebê, pode provocar falhas nas orelhas, problemas de audição e visão,
deficiência mental e defeitos no coração capazes de levar à morte. A mulher só
consegue comprar a isotretinoína depois de assinar um documento em que atesta
estar ciente dos riscos para o feto e da necessidade de usar simultaneamente
dois métodos contraceptivos (a camisinha e a pílula, por exemplo) para não
engravidar durante o tratamento.
— Os remédios não são inofensivos. Pelas
pessoas em geral, devem ser utilizados com bastante cautela, sempre sob
orientação médica. Durante a gravidez, os cuidados precisam ser redobrados —
afirma Helaine Milanez, médica e professora de Obstetrícia da Unicamp.
Na grande maioria dos medicamentos, ao
contrário dos exemplos enumerados acima, não se conhecem com precisão os
efeitos colaterais no bebê. Os experimentos costumam ser feitos com ratas ou
macacas prenhes e os resultados nem sempre são os mesmos nos humanos. Os
testes nunca são feitos com mulheres grávidas devido aos perigos para o
desenvolvimento do feto.
Os efeitos colaterais vão sendo descobertos
aos poucos, à medida que são relatados aos laboratórios farmacêuticos e às
autoridades sanitárias pelas mulheres que inadvertidamente tomaram os remédios
na gravidez.
Pelas contas dos médicos, 3% das malformações
congênitas são provocadas pelos medicamentos.
— Os riscos dos remédios durante a gravidez
precisam ser explicados à grávida pelo médico obstetra logo na primeira
consulta do pré-natal. Isso é particularmente essencial no Brasil, onde ainda
temos o perigoso hábito da automedicação — diz o médico José Mauro Madi,
integrante da Comissão de Assistência Pré-Natal da Febrasgo (entidade dos
ginecologistas e obstetras).
Os especialistas dizem que nem sequer os
remédios fitoterápicos (feitos à base de ervas), os homeopáticos e os florais
podem ser consumidos durante a gestação sem orientação médica. Tampouco as
vacinas devem ser tomadas por conta própria. Certos produtos para os cabelos
(como os que contêm amônia) e para o rosto (como os compostos de ácido
retinoico) estão terminantemente proibidos na gravidez.
Há, naturalmente, casos em que a grávida não
pode ficar sem remédio. A diabética que não toma os remédios na gestação, por
exemplo, tem um elevado risco de sofrer aborto e dar à luz um bebê morto. Quem
sofre de hipertensão ou asma também não pode ficar sem tratamento, para o bem
do feto. Em situações do tipo, o médico busca o remédio que, dentro do
possível, ofereça o menor risco para o bebê em formação.
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