O professor e economista Fabio Giambiagi, em seu livro “Capitalismo: modo de usar” (Elsevier, 2015) expõe, com diversos exemplos, situações do contexto econômico brasileiro que provam que o país ainda não é capaz de manusear da melhor maneira possível o sistema capitalista em que estamos inseridos. Um de seus exemplos é a baixa produtividade do trabalhador brasileiro quando comparado a outros países, situação que se reflete na baixa competitividade da indústria brasileira.
No jogo político, propostas com vistas a melhorar o ambiente econômico do país são muitas vezes recebidas com grande ceticismo no Parlamento, sendo difícil de conseguir sua aprovação. Além disso, propostas que fazem sentido econômico por vezes são impopulares e acabam sendo atacadas por diversas frentes sociais que resistem a qualquer tipo de mudança – mesmo que seja benéfica para a maioria da população.
A Reforma Trabalhista, recém sancionada pelo Presidente Michel Temer na Lei n. 13.467, de 13 de julho de 2017, representa exatamente a situação acima descrita: a proposta de modernização e flexibilização da legislação trabalhista sofreu ataques dos mais diversos lados, desde movimentos sociais que se mobilizavam contra as mudanças, membros da Academia que se fechavam em seu espectro ideológico e o fatídico episódio da tomada da Mesa do Senado por membros da oposição.
De toda sorte, o Governo Federal obteve sucesso em aprovar o importante projeto da Reforma Trabalhista. Em meio a tanta desinformação disseminada – por vezes, com o mero intuito de fazer fumaça e exaltar ânimos – este pequeno artigo optou por explorar pontos da reforma da CLT que acabaram não sendo tão comentados. A Reforma Trabalhista não se resume somente à nova roupagem legal conferida aos acordos e convenções celebrados entre empregado e empregador (inclusão do art. 611-A) ou à extinção da contribuição sindical obrigatória (revogação do art. 601), mas também diversos outros pontos que ainda não foram tão debatidos e que demonstram benefícios aos trabalhadores, sem “nenhum direito a menos”.
Iniciemos com a questão acerca da relativização da hipossuficiência do trabalhador. A Reforma Trabalhista inclui parágrafo único no art. 444 da CLT que “a livre estipulação a que se refere o caput deste artigo aplica-se às hipóteses previstas no art. 611-A desta Consolidação, com a mesma eficácia legal e preponderância sobre os instrumentos coletivos, no caso de empregado portador de diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social”.
Qual o significado desta disposição? Ora, o trabalhador que possua diploma de nível superior e, atualmente, salário igual ou superior a R$ 11.062,62 poderá dispor, individualmente, sobre os mesmos direitos previstos no art. 611-A, tendo, assim, prevalência sobre a lei.
Para os trabalhadores que possuem tais qualificações, esta disposição abre caminho para uma importante conquista: a possibilidade de solução de seus litígios através de procedimento arbitral. A Reforma da Lei de Arbitragem, em 2015, já havia tentado incluir no texto da Lei n. 9.307/1996 disposição semelhante, mas que acabou sendo objeto de veto pela Presidente Dilma Rousseff quando da ocasião de sua sanção, pois, de acordo com as razões do veto, “acabaria por realizar uma distinção indesejada entre empregados”.
O novo art. 507-A da CLT dirime qualquer dúvida que poderia ainda existir sobre isso: “nos contratos individuais de trabalho cuja remuneração seja superior a duas vezes o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social, poderá ser pactuada cláusula compromissória de arbitragem, desde que por iniciativa do empregado ou mediante a sua concordância expressa, nos termos previstos na Lei no 9.307, de 23 de setembro de 1996”.
Desta forma, respeitados os pressupostos de arbitrabilidade (direitos patrimoniais disponíveis), empregados que aufiram tal remuneração passaram a ter mais uma possibilidade para resolução de seus litígios, concretizando o princípio da inafastabilidade da jurisdição e tempo razoável do processo.
No mesmo sentido, outro importante ponto a se tocar é a inclusão da jurisdição voluntária no texto da CLT. Com a inclusão do art. 855-B, as partes poderão buscar ao Poder Judiciário a homologação de acordo extrajudicial, desde que apresentem petição conjunta, assinada pelos advogados de cada parte. Ao empregado, faculta-se a possibilidade de ser assistido pelo advogado do sindicato de sua categoria.
Esta disposição altera a dinâmica das negociações extrajudiciais entre empregadores e empregados. Atualmente, a CLT não admite a negociação entre empregado e empregador como forma de quitação trabalhista, não sendo reconhecida estas transações pelos tribunais.
Como se verifica nos exemplos acima, a Reforma da CLT traz para o empregado uma maior autonomia para decidir situações essenciais do seu cotidiano, gerando maior integração entre empregados e empresa. Usando novamente das palavras de Giambiagi, tal cooperação entre as duas pontas da relação de trabalho se traduz em maior eficiência, aumentando a produtividade da empresa e gerando avanços na eficiência econômica.
A maior produtividade e eficiência da indústria brasileira faz com que ela volte ao cenário competitivo internacional, atraindo novos investimentos e fomentando a inovação. Com isso, é de esperar que novos postos de emprego sejam criados, como efeito direto da modernização da legislação laboral.
Como colocado por Gesner Oliveira, as novas disposições da CLT favorecem justamente quem mais cria postos de trabalho: as pequenas e médias empresas, a partir da redução dos custos de transação no mercado de trabalho. Além disso, o ambiente econômico atual, pautado nas start-ups e na economia de compartilhamento, é extremamente dinâmico, demandando respostas rápidas e flexíveis aos problemas que surgem. Nunca é demais lembrar que a CLT foi promulgada há 74 anos, quando a população brasileira era eminentemente rural.
A Reforma Trabalhista é somente uma peça no quebra-cabeças que deve ser resolvido para que o país consiga enfrentar e sair vitorioso da crise que enfrenta nos últimos anos. Outras peças indispensáveis para esse objetivo são a reforma da previdência e a reformulação do sistema tributário. Nesse aspecto, percebe-se que nem todas as reformas são negativas igual muito se tem pregado. É louvável a iniciativa da Presidência da República e de sua equipe econômica para buscar essas finalidades, criando um ambiente propício de crescimento econômico e de maior bem-estar para os brasileiros.
Nelto Luiz Renzetti é ex-presidente da Comissão de Direito do Trabalho da OAB-Maringá/PR. Sócio da Renzetti & Botti Advogados.
Revista Consultor Jurídico, 12 de agosto de 2017, 7h02
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